O Orçamento de 2026 foi aprovado. Superávit na planilha, miséria no rodapé. R$ 34,5 bilhões de “responsabilidade fiscal” para foto oficial, enquanto R$ 61 bilhões em emendas parlamentares escorrem soltos, felizes e eleitoralmente lubricados. O ajuste vem de onde sempre vem: Previdência enxugada, Auxílio Gás comprimido, Pé-de-Meia emagrecido. O cofre público fecha no azul; a vida real, no vermelho.
É o velho truque: chama de arcabouço o que é andaime de campanha. Emendas obrigatórias, pagamento acelerado, prioridade absoluta - não para políticas públicas estruturantes, mas para a geografia do voto. Quando falta dinheiro, corta-se do pobre; quando sobra influência, distribui-se entre aliados. Simples assim. Didático até.
No meio do baile, o Supremo puxa o freio. Flávio Dino suspende a gambiarra que pretendia ressuscitar emendas mortas entre 2019 e 2023 - restos a pagar com vocação de zumbi fiscal, autorizados a caminhar até 2026. Não passou. O recado foi claro: orçamento não é necromancia.
No Planalto, a resposta vem com veto e bloqueio. O Executivo diz “sem negociação, sem festa”. Porque, na reta final, o Congresso Nacional tentou redirecionar até R$ 11,5 bilhões para demandas com cheiro de urna, empurrando políticas sociais para o canto do salão. É a política do cobertor curto: cobre o mandato, descobre o país.
O resultado é um retrato cruel e conhecido. Austeridade para quem depende do Estado; generosidade para quem manda nele. Superávit como virtude cívica; emenda como vício sistêmico. E seguimos chamando isso de normalidade democrática. Genial não é o orçamento. Genial é a capacidade de vender desigualdade com selo técnico e recibo carimbado.
Crédito: Escritor e Advogado Julio Benchimol Pinto

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