Quebra -Bunda
Sem por que, lembrei-me hoje da Ladeira do Quebra-Bunda, na Roça da Sapucaia, a quatro quilômetros de Ibirataia, para onde eu ia com o meu pai bandeirar cacau. Levava uma marmita de três andares, com uma farofa fria para o almoço, porque só voltaríamos no fim da tarde. Do alto dos meus 10 anos, ou pouco mais, ou pouco menos, pouco eu enfronhava no trabalho, é verdade, mas gostava de ver lá do alto da ladeira, as cabaças sendo colhidas pelos trabalhadores, com seus podões imponentes, e jogadas no boqueirão, para serem juntadas depois pelas mulheres, geralmente, para fazer a quebra. Não sem antes escolhermos as cabaças mais novas para aparar o mel do cacau. Cavamos um buraco no chão, ao lado da ruma onde o cacau seria quebrado e descaroçado, com 60 cm de largura por 20 de fundura e o forrávamos com folhas de bananeira. À medida que as amêndoas do cacau eram despejadas sobre a cama, também feita com folhas de bananeira, o mel ia escorrendo para dentro do buraco. E eu já me punha à frente com uma cumbuca de cabaça, pronto para enchê-la e beber o deliciosíssimo mel. Mas sem exagerar, porque a dor de barriga era daquelas de arrepiar o cangote e não dá tempo nem de chegar atrás da moita.
Corria pelas roças e o cacaual parecia sempre carregado, as folhas caiam de todas as árvores, como se fossem cabaças mágicas a enfeitar o chão. E novos bilros já estavam em flor. Sim, o cacau tem flor, uma flor branca e mimosa, que logo se transformava em frutos de ouro, cobiçado e respeitado onde quer que chegasse. Ver suas amêndoas secando sobre a barcaça, dava uma enorme satisfação e orgulho. E depois as sacas de quatro arrobas eram transportadas para a firma compradora.
Que pena que a cultura já não é a mesma!... A bruxa foi solta e o cacau de outrora, sobre as barcaças, hoje é um punhado ao sol, esparramado no terreiro.
As estufas não têm mais serventia. Infelizmente.
Matéria: Escritor e Poeta Achel Tinoco
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