Matéria: Escritor e poeta Achel Tinoco
O doutor Ciro Tinôco, este aí abaixo, o primeiro da direita — o outro é Luiz, o meu pai, e as tias Nair e Bernadete. Depois, falo deles.
"Ciro, um dentista desanimado com a profissão, e com um casal de filhos para criar, abandonou a carreira para se dedicar à fazenda Santa Cruz, à criação de gado e aos galos de briga. O anel de formatura, com 14 pedrinhas de brilhantes, além da granada e das cobrinhas presas ao bastão, ele o jogou por distração às galinhas, sob o sapotizeiro, em vez do milho. De todo jeito tentou fazê-las expelir o 'chuveiro', sem sucesso. Era um homem calmo, incapaz de se alterar por coisa pouca."
Doutor Ciro que nada, era o tio Ciro, simplesmente. Bastava isso. Tão doce, tão meigo, tão prestativo, tão tio. Até o cantor Gilberto Gil o elogiou: "Era o meu dentista. Nunca vi homem mais paciente e generoso", quando eu lhe falei do meu livro "Vilarejo dos anjos". Nele conto a história da família Tinôco e um pouco da vida de Gil, quando ele morou por um tempo em Ibirataia.
Sempre que podia, tio Ciro me mandava sapotis de sua xácara, colhia-os com tanto cuidado, qual fossem pequenos tesouros.
Certa vez, ele veio a Salvador para fazer uns exames — saibam vocês que o homem da roça só vem à capital para se consultar com um médico. Pois, tio Ciro ficou hospedado no meu apartamento. Pela manhã, fui conceder uma entrevista à TV Bahia. Quando voltei, ele me fez mil elogios, disse que eu tinha muita desenvoltura diante das câmaras, que eu era, sim, um grande escritor, coisas de tio. Tossiu, comeu pouco e, depois do almoço, viajou. Eu não tinha um real na carteira naquele dia. Aliás, a carteira do escritor que eu era andava sempre a precisar de alguma piedade. Ao pegar um caderno, na cabeceira da minha cama, estava lá, dobradinha, uma nota de 50 reais. Tio Ciro, claro! Fiquei tão feliz, não apenas pelo dinheiro, mas pelo gesto, pelo carinho, pelo cuidado. Ele era assim. E todos que o conheceram, podem atestar o que digo. Hoje, não sei por que, tio Ciro me fez falta. Acho que é por causa dos sapotis, que nunca mais os ganhei; acho que é por causa dele mesmo que nunca mais esteve aqui. E vai chegando o Natal, vamos sentindo as faltas todas.
Saudade!
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