Se fosse me escrever, eu começaria por essa angústia que me contorna a alma e não a deixa navegar livremente pelos mares de abril. Apresa-me o coração àquela ilha dentro da qual estou a me ver desnorteado. E não tenho de meu um barquinho de papel que seja para me escapar de mim mesmo e partir em busca da minha filha, mas sonho em navegar na calmaria, sob um céu de prisioneiro.
São sentimentos conflitantes e desajustados, eu sei, os que levo comigo nesta embarcação descartável em cujas velas foram pintadas as nossas promessas de cumplicidade. Preciso impulsionar, mesmo assim, uma remada de ventos e, empurrar porta fora, os fantasmas do mar.
Não são harmônicas nem ritmadas as vagas que encharcam a areia da praia e me impelem a sair daquela ilha para que ela se veja a si mesma, como prega o carpinteiro José, o Saramago, uma vez que a paixão turvou-me o olhar de tempestade.
Tateio pelo quarto sem dormir.
A solidão, por um lado, é a minha guardiã;
a saudade é-me, todo dia, a luz duma manhã;
e cá, tão distante, não vejo o sol que se põe, inexoravelmente, às minhas costas.
Anoiteço do outro lado da baía, portanto,
submergindo o leme por esta razão:
esqueci-me de mim tantas vezes, como me esqueceste, completamente, nos últimos seis meses.
Mas hei de amanhecer novamente!...
Crédito: Escritor Achel Tinoco
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