Continuação:
'"Estava escrito na Praia do Forte", título provisório, eu mesmo não gostava. Caetano Veloso me disse que era um título provinciano. Ele chegara a Salvador no voo 1602, da Gol, previsto para chegar às 18h05min ao Aeroporto Internacional Dep. Luiz Eduardo Magalhães. Eu o esperava desde às cinco e meia, a pedido do meu irmão que tinha uma empresa de transportes. Eu deveria acompanhá-lo pelos próximos dois dias, enquanto ele participava da gravação de um DVD da cantora Beth Carvalho. Ele surgiu no portão de desembarque trazendo nas mãos uma caixa de violão e uma pequena mochila no ombro, imediatamente atrás vinha a sua produtora Giovana Chanley. Apresentei-me a ambos e disse que estava ali para levá-los para casa. Tomei o violão das mãos de Caetano e os indiquei a porta automática atrás da qual estava o meu carro estacionado. Arrumei a bagagem de ambos no porta-malas e sentei-me ao volante.
“Caetano prefere ir na frente”, disse-me Giovana. E ele sentou-se no banco do carona e afivelou o cinto de segurança.
Dei partida ao motor e perguntei-lhe se preferia que eu ligasse o ar-condicionado.
“Não precisa, quero sentir o calor da Bahia”, ele falou com o seu sorriso debochado. “No Rio de Janeiro está muito frio, chegou ontem a 11 graus...”
Animei-me com a simpatia que ele demonstrou. Disse-lhe que em Salvador o clima estava bom, choveu um pouco ontem à noite, mas hoje fizera sol.
Giovana, sentada no banco traseiro, começou a conversar sobre o quanto gostava da Bahia:
“Isso aqui é uma terra abençoada...”
Na saída do bambuzal, antes de fazer o contorno para seguirmos ao centro da cidade, ficamos um minuto parado no engarrafamento.
“Acho que será necessário a prefeitura construir um viaduto nesta área”, eu comentei despretensiosamente, ao que Caetano respondeu:
“Com o crescimento da cidade para o lado de cá, e com a proximidade e a importância da Praia do Forte, acho também que não há alternativa...”. Voltou-se para a sua produtora: “Você conhece, Giovana?”
“Ainda não, mas gostaria muito!...”
Ele continuou:
“É de um alemão...”
Era a deixa que eu estava esperando para dizer-lhe que eu era escritor, lutando pelo meu lugar ao sol. O interrompi:
“Não é de um alemão, na verdade ele é paulistano”, disse com convicção.
“Você o conhece?”, Caetano me perguntou.
“Estou escrevendo a biografia dele...”
Ele não se alterou, nem demonstrou surpresa:
“Então me conte como ele chegou até aqui”.
“O senhor Klaus Peters”, eu lhe disse “chegou a este Litoral Norte quase por acaso, aliás, tudo na vida dele, como acredita, aconteceu por acaso...”
“Não podemos deixar de admitir”, ele comentou distraído, “ele fez um ótimo trabalho. Aquilo lá está uma beleza.
Agora falávamos de literatura, não de música como seria mais provável, dos livros que ele escreveu, dos livros que eu escrevi etc. Mais adiante, quando já havíamos atravessado toda a Avenida Paralela, passando pela rodoviária, conversávamos sobre política, e ele me dizia de sua decepção com o governo lula, embora ele fosse um homem bonito... Quê? Chegamos ao Rio Vermelho, mas antes de ele chegar a casa, pediu-me que parasse no Largo da Mariquita, ao lado do tabuleiro de uma baiana, para comprar acarajés. Enquanto isso, eu já me adiantava e escrevia uma dedicatória num livro que trazia no carro, justamente para essas emergências. Dei-lhe o meu "Vilarejo dos Anjos", prefaciado pelo professor Pasquale Cipro Neto, que ele folheou e disse-me que assim que terminasse de ler escreveria um comentário para um jornal qualquer. Até hoje espero."
P.: acabei mudando o título do livro para O CASTELO DE WILHELM HERMANN. Nele, conto a história de Klaus Peteres e a sua fantástica Praia do Forte.
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