Faz quanto tempo que você não dança? Não, não é pular atrás do trio, ou rebolar como se levasse um choque elétrico. Dançar como antigamente, de rosto colado, depois de meia hora volteando a dama sem saber como convidá-la para esta contradança. Vá lá, ela aceitou. Lá vou eu: as pernas trêmulas, sem saber como usar as mãos, os gestos não se entendem, mas já estamos no salão. Com muito esforço, dou a volta com o braço na cintura da donzela, se for o caso, puxando-a para perto de mim com tanto arrocho, que o sentimento é capaz de se fazer dentro do vestido dela ou dentro da minha calça de tergal azul. Um arrepio corre pelo espinhaço abaixo. Não posso desistir agora, sou um cavalheiro adolescendo, antes mesmo de sentir do seu pescoço o perfume. Piso levemente no seu pé, como para avisá-la que sou um rapaz iniciante nessa arte de dançar, e sem nenhum talento. Que inveja eu sentia de outros moleques que pareciam ter nascido dançando. Os cabelos da rapariga se jogam contra o meu nariz, inspirando-me a abraçá-la com mais vigor, enquanto a música está romântica do tanto de me fazer sonhar. A cabeça vai descambando para o seu ombro. Piso novamente no seu pé, sem querer, claro está. Não demora e ela vai me enxotar, preciso dizer alguma coisa convincente: “Faz tempo que eu pensava em dançar com você”, lá pelas tantas, temendo que a música acabe e comece a tocar “Don't Let Me Be Misunderstood”, aquela do Santa Esmeralda, e ela se afaste de mim. “E por que não me convidou...?” Apesar da surpresa da resposta da menina, senti-me mais animado, a ponto de ir virando o rosto devagarinho para ver se ela vinha na mesma direção, de modo que os lábios se encontrassem casualmente. Ah, não foi um beijo, mas uma colada da minha calça de tergal com o seu vestido de bolinha. E a vergonha agora de que a menina me percebesse nessa situação vexaminosa! Não vi o arrebitamento do bico dos seus seios. Não tinha instrução para isso, convidei-a tão somente para nos sentarmos num cantinho qualquer do clube social para acertar os detalhes do namoro.
The end.
Escritor e poeta Achel Tinoco.
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