O que nos enriquece na verdade é a infância. As perdas são imperceptíveis; as dores são as dos joelhos ralados; as lágrimas são feitas de dengo. O amor nos cerca e nos protege, mesmo que não o entendamos, e ainda nos abusam tantos beijos e abraços. A vida é ainda um faz de conta, uma história contada repetidas vezes, um pratinho derramado à mesa, e nenhuma conta a nos chegar. Mamãe e papai são heróis de coração de manteiga: não vão levar-nos hoje à escola porque alguém amanheceu com o nariz escorrendo. Mas não adianta reclamar: os dentinhos pulam da boca, e tem aquela mãe que os guarda para fazer um colar. Pior são os apelidos: ‘Cabeça de arromba navio’; ‘Pau vestido’; ‘Gorducha’; ‘Grilo ensebado’; ‘Rãzinha’. Ah, ninguém se importa, a porta está sempre aberta, a casa do vizinho é o melhor refúgio; a rua é nossa irmã para brincar, e não nos obriga a tomar banho nem a escovar os dentes. Melhor de tudo: não tem segunda-feira.
Matéria: Escritor Achel Tinoco
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